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sábado, 25 de junho de 2011

Ausência de publicação na página eletrônica do TJ não pode prejudicar as partes

Omissão do cartório judicial em publicar a juntada do aviso de recebimento de carta de citação causou a revelia dos réus, pois não responderam à ação.

Isso porque o artigo 241, I do CPC estipula que o prazo para responder começa a transcorrer após a juntada do último aviso de recebimento.

Logo, caracterizado o prejuízo às partes em função da ausência de publicação na página de internet do TJ, foi reconhecida a justa causa de que trata o artigo 183, § 2° do CPC:

Art. 183 - Decorrido o prazo, extingue-se, independentemente de declaração judicial, o direito de praticar o ato, ficando salvo, porém, à parte provar que o não realizou por justa causa.

§ - Verificada a justa causa o juiz permitirá à parte a prática do ato no prazo que lhe assinar.

Considerou-se que a evolução da virtualização é uma importante ferramenta que reflete no cumprimento ao princípio da eficiência da Administração e também ao princípio da celeridade processual.

A decisão é do STJ – 3ª Turma – e foi alcançada após a interposição de recuso especial. Segue o resumo para melhor cognição:

PRAZO. INFORMAÇÕES PROCESSUAIS. INTERNET.

In casu, o recorrido propôs ação declaratória de nulidade de cláusulas contratuais contra as recorrentes, que foram citadas pelos Correios. Nos termos do art. 241, I, do CPC, o prazo para responder começaria a transcorrer apenas após a juntada do último aviso de recebimento. Ocorre que, por omissão do cartório judicial, não foi publicada na página eletrônica do TJ informação referente à juntada aos autos do aviso de recebimento da última carta de citação, de tal modo que nenhum dos réus respondeu à ação. Portanto, no REsp, a controvérsia centra-se na possibilidade de permitir a reabertura de prazo para a prática de ato processual que não foi realizado em razão de equívoco ou omissão constante das informações processuais veiculadas na página eletrônica do TJ. A Turma entendeu que, no atual panorama jurídico e tecnológico, é imprescindível atribuir confiabilidade às informações processuais que são prestadas pelas páginas oficiais dos tribunais. Isso porque não é razoável que o conteúdo de acompanhamento processual eletrônico dos tribunais não possa ser digno de plena confiança de quem o consulta diariamente. Consignou-se que, não se podendo confiar nas informações veiculadas, a finalidade dessa inovação tecnológica acaba por ser desvirtuada. Afinal, a informação prestada erroneamente é, a toda evidência, mais danosa do que a simples ausência de informação. Registrou-se, ainda, que, com a evolução que a virtualização dos processos representou, a confiança nas informações processuais fornecidas por meio eletrônico implica maior agilidade no trabalho desenvolvido pelos cartórios e pelas secretarias judiciais, ensejando maior observância ao princípio da eficiência da Administração e, por conseguinte, ao princípio da celeridade processual. Ademais, as informações veiculadas pelos tribunais em suas páginas da Internet, após o advento da Lei n. 11.419/2006, devem ser consideradas oficiais de tal sorte que eventual equívoco ou omissão não podem ocorrer em prejuízo da parte. Ressaltou-se, por fim, que o simples fato de o advogado dos réus ter confiado no sistema de informação processual disponibilizado na Internet pelo próprio tribunal ensejou a drástica configuração da revelia, o que não pode ser admitido. Assim, reconheceu-se, na hipótese, a justa causa a que alude o § 2º do art. 183 do CPC. Diante disso, deu-se provimento ao recurso especial. Precedente citado: REsp 1.186.276-RS, DJe 3/2/2011. REsp 960.280-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/6/2011 (vide Informativo n. 460). Fonte: STJ.


quinta-feira, 23 de junho de 2011

Na Bolívia, Evo Morales decide legalizar carros contrabandeados

O presidente da Bolívia, Evo Morales, decidiu legalizar veículos sem documentação regular que circulam pelo país, muitos dos quais ingressaram via contrabando de países vizinhos. Mato Grosso é considerado um dos principais fornecedores de veículos para os bolivianos, especialmente de camionetes roubadas. De acordo com a Polícia, os carros e motocicletas são usados como moeda de transações com o tráfico de drogas.

Morales promulgou a lei que dá prazo de 15 dias, para o registro legal dos carros sem documentação. O processo custará entre US$ 2.000 (R$ 3.164) e US$ 3.000 (R$ 4.746) por veículo para o interessado. A estimativa divulgada pelo governo é de que haja cerca de 10 mil carros nessas condições e que a adesão ao processo de legalização gere uma arrecadação aproximada de US$ 5 milhões (R$ 7,9 milhões) aos cofres públicos.

Na iniciativa privada, porém, estima-se a existência de até 120 mil veículos irregulares na Bolívia e uma provável arrecadação de até US$ 100 milhões (R$ 158 milhões) por parte do governo.

O governo diz que rechaçará a legalização de veículos que sejam produto de roubo.

A medida causou polêmica. Muitos veem nela um incentivo à criminalidade. Em retaliação, o sindicato dos motoristas da Bolívia anunciou greve de 24 horas a partir de segunda-feira. Milhares de carros sem documentos estão entrando no país nas últimas horas para tirar proveito da lei, disse o secretário do sindicato, Néstor Garnica.

Jornais bolivianos relatam uma forte atividade na fronteira com o Chile, onde os proprietários estão buscando rotas alternativas para chegar ao país.

Morales justificou sua decisão dizendo que ela beneficia a gente pobre. Todos nós temos o direito de ter um carro, disse. Ele pediu que essa não se transforme numa questão de Estado.

Fonte: Redação 24 Horas News.


Ter pena dos pobres é uma coisa, agora, incentivar o crime é outra!

Enquanto isso, do lado de cá da fronteira, os honestos trabalham arduamente com intento de conseguir comprar um automóvel qualquer, dia após dia. Pelo menos, os infelizes proprietários de veículos subtraídos agora sabem a localização – ou o destino – dos seus carros, motos, caminhões, etc.

Lamentável...

sábado, 18 de junho de 2011

É juridicamente possível o ITCMD progressivo?

Primeiramente, cumpre esclarecer que o ITCMD terá alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal - conforme estabelece a Constituição Federal no artigo 153, § 1º, IV. Nesse sentido a Resolução 9/92 (do Senado) estipulou a alíquota máxima de 8% (oito por cento).

Desse modo, por meio da mesma Resolução, o Senado estipulou que as alíquotas poderão ser progressivas em função do quinhão que cada herdeiro efetivamente recebe. Portanto, deve-se considerar que a alíquota será instituída de acordo com a parte transmitida a cada herdeiro (quinhão) e não em razão da totalidade dos bens (monte-mor).

Com efeito, cumpre transcrever o teor do artigo 35, parágrafo único do CTN, que assim prega: “Nas transmissões causa mortis, ocorrem tantos fatos geradores distintos quantos sejam os herdeiros ou legatários.” Sendo assim, as bases de cálculo do imposto devem ser separadas, pois o contribuinte é o destinatário do bem e não o doador ou transmitente.

Logo, em respeito ao dispositivo constitucional do artigo 145, § 1º, a instituição de alíquotas progressivas deverá observar o valor dos bens transmitidos a cada sucessor ou donatário, individualmente, no intuito de considerar a capacidade contributiva de cada um, conforme permeiam também os princípios do Direito Tributário.

Observando tais aspectos, a progressividade é maneira que visa efetivar o princípio da capacidade contributiva e adequação do tributo à capacidade econômica, propiciando assim mecanismos de modesta redistribuição de renda e desestímulo à acumulação de riqueza.

Seguindo o mesmo raciocínio pondera o renomado doutrinador Hugo de Brito Machado[1]:

Os impostos reais, ou seja, aqueles que consideram objetivamente a situação material sem levar em conta as condições do contribuinte, também devem ser informados pelo princípio da capacidade contributiva e da progressividade que constitui postulado universal de justiça fiscal.”

No mesmo diapasão argumenta Sacha Calmon Navarro Coelho[2]:

“A progressividade assegura a graduação dos impostos conforme a capacidade econômica do contribuinte, constituindo-se em conseqüente lógico do princípio da igualdade e, portanto, dispensando qualquer previsão expressa.”

No entanto, apesar de considerar os aspectos favoráveis atinentes à progressividade do ITCMD, cumpre esclarecer que tal mecanismo está autorizado pela legislação apenas em razão da porção destinada a cada herdeiro ou legatário, consoante legítima ou parte individual dos bens transmitidos. Portanto, é juridicamente possível a progressividade do ITCMD neste enquadramento jurídico, referente às alíquotas progressivas com base no quinhão ou porção individual destinada a cada beneficiário.

De outro lado, alguns estados da federação costumam adotar a progressividade do ITCMD sem observar as hipóteses admitidas, como por exemplo, a instituição de alíquotas progressivas em razão da base de cálculo, ou seja, calcadas diretamente no monte-mor.

Tal prática é considerada ilegal, eis que a Resolução 9/92 do Senado Federal em seu artigo 2º, como também o artigo 35, parágrafo único do CTN, autorizam claramente a progressividade da alíquota em função dos quinhões individuais e não da totalidade da herança ou doação.

Ressalte-se que o contribuinte do ITCMD é o beneficiário (recebedor) e não o transmitente da herança ou doação.

Em relação ao entendimento firmado pelo STF, apesar de estar em andamento o julgamento referente à progressividade do ITCMD, decisões anteriores remetem sua inaplicabilidade.

Logo, a progressividade tratada pelo artigo 145 da Constituição Federal se referiria aos impostos com caráter pessoal. Como o ITCMD é tributo tipicamente real - na medida em que considera o valor do bem e não da capacidade econômica do contribuinte - não seria aplicável a progressividade. Este é o entendimento do STF[3] em relação ao IPTU:

Sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem caráter real que é incompatível com a progressividade decorrente da capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (específico) A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude o inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º. Portanto, é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal.”

Sendo assim, segundo o entendimento do STF, a progressividade somente é aplicada para os impostos de natureza pessoal, o que exclui o ITCMD, que é considerado de natureza real.

Em que pese o entendimento pretoriano, para nós, é juridicamente possível a progressividade de alíquotas do ITCMD, desde que relativas ao quinhão ou parte individual transmitidas a cada herdeiro ou donatário, de modo a incentivar a aplicação do princípio da capacidade contributiva e da redistribuição de renda, por estar explicitamente autorizada pelo CTN e pela Resolução 9/92 do Senado Federal.


Referências Bibliográficas:Referências Bibliográficas:

CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 25ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.

COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009.



[1] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 24ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2004. Pág. 387.

[2] COELHO. Sacha Calmon Navarro. Curdo de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2004. Pág. 266.

[3] STF. Recurso Extraordinário nº 153771/MG. Relator: Ministro Moreira Alves. Tribunal Pleno. Data 05/09/1997.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Prova colhida no inquérito não é prova por completo – deve ser corroborada em juízo

Em decisão recente o STJ absolveu réu condenado criminalmente pelo TJ/RS; o Tribunal tinha se baseado apenas nas provas produzidas em sede de inquérito policial para proferir condenação pela prática de furto qualificado.

Apesar das provas extrajudiciais terem apontado o acusado como um dos autores do furto, não ocorreu confirmação em juízo, sob o crivo do contraditório e ampla defesa.

Portanto, houve dissonância entre as provas produzidas na investigação e as colhidas judicialmente. A decisão se baseia, prioritariamente, no conteúdo do artigo 155 do CPP, com a redação dada pela Lei 11.690/08:

“O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova, produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.”

A ferramenta processual escolhida foi o habeas corpus. No sentido de aprimorar a cognição, segue abaixo trecho da decisão que ilustra a principal fundamentação:

“STJ. O acórdão condenatório proferido pelo TJ lastreou-se apenas em provas colhidas no inquérito. Porém a função do inquérito, como se sabe, é de fornecer elementos tendentes à abertura da ação penal (vide Exposição de Motivos do CPP, arts. 12 e 155, desse mesmo código, este último na redação que lhe deu a Lei n. 11.690/2008), pois, conforme vetusta doutrina, a prova, para que tenha valor, deve ser feita perante o juiz competente, mediante as garantias de direito conferidas aos indiciados e de acordo com as prescrições estabelecidas em lei. Assim, o inquérito toma feitios de instrução provisória, cabendo à acusação fazer a prova no curso da instrução criminal ou formação da culpa, atenta ao contraditório: é trabalho da acusação transformar os elementos do inquérito em elementos de convicção do juiz. Dessarte, a condenação deve fundar-se, sobretudo, nos elementos de convicção da fase judicial, o que não ocorreu na hipótese. Precedentes citados: HC 112.577-MG, DJe 3/8/2009; HC 24.950-MG, DJe 4/8/2008, e HC 56.176-SP, DJ 18/12/2006. HC 148.140-RS, Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 7/4/2011.”

A correta aplicação das normas é a garantia de cumprimento ao princípio basilar da segurança jurídica, que dessa vez foi respeitado e merece o devido reconhecimento.

Em sentido contrário, por vezes identificamos a incidência de decisões unilaterais – para não dizer egoístas -, carentes de bom-senso e com profundo desrespeito às regras legais, decisões que ao invés de proteger e albergar quem necessita da tutela jurisdicional servem somente para, verdadeiramente, propagar temor na sociedade.

As errôneas e equivocadas decisões judiciais devem ser combatidas/repelidas, como ocorreu no caso presente; dessa forma, a perfeita interpretação da Lei foi vitoriosa ao contemplar a tão reclamada justiça.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Estado do Paraná é obrigado a fornecer medicamento de alto custo para pessoa com doença grave

Criança que nasceu prematura (sistema imunológico frágil) necessitava do medicamento Palivizumab (synagis, necessário para preveni-la de infecções respiratórias ocasionadas pelo Vírus Sincicial Respiratório (VSR) - que comumente ataca recém-nascidos.

Como o medicamento não é disponibilizado pelo SUS, além do que, o valor do tratamento completo é demasiado caro, obteve-se sucesso em adquiri-lo através de mandado de segurança com pedido liminar, cujo acórdão dotado da motivação completa segue na íntegra:

MANDADO DE SEGURANÇA Nº 773283-6, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA

Impetrante: EMILLI VITÓRIA KOSOUSKI (Representada)

Impetrado: SECRETÁRIO DE SAÚDE DO ESTADO DO PARANÁ

Relator: Des. LEONEL CUNHA

Advogados: Dr. Rafael Ernani Cabral Brocher e Dr. Thiers Andregotti

EMENTA

1) DIREITO CONSTITUCIONAL. MEDICAMENTO. PALIVIZUMAB. PREVENÇÃO DE INFECÇÕES RESPIRATÓRIAS PELO VÍRUS SINCICIAL RESPIRATÓRIO (VSR). DEVER DO ESTADO. GARANTIA E EFETIVIDADE DO DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE.

a) O Poder Público tem o dever de fornecer medicamentos aos necessitados, assegurando o direito fundamental à saúde previsto na Constituição Federal (Artigos 6º e 196).

b) No caso dos autos, havendo solicitações médicas dando conta de que dado remédio é necessário para prevenir a Impetrante de infecções respiratórias pelo Vírus Sincicial Respiratório (VSR) no período de sazonalidade (maio a setembro), em razão do seu histórico de complicações pulmonares, o seu não fornecimento implica em violação a direito líquido e certo.

2) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. MEDICAMENTO. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.

O Mandado de Segurança é instrumento processual adequado para assegurar o fornecimento de remédio cuja necessidade é suficientemente comprovada por laudos médicos, dispensando-se a dilação probatória inerente às vias ordinárias.

3) SEGURANÇA CONCEDIDA.

Vistos, RELATÓRIO

1) EMILLI VITÓRIA KOSOUSKI, menor impúbere, representada pelo seu genitor ANDERSON MARCOS KOSOUSKI, impetrou Mandado de Segurança em face do Senhor SECRETÁRIO DE SAÚDE DO ESTADO, a fim de obter o fornecimento gratuito do medicamento denominado Palivizumab (synagis) 15 mg/kg, necessário para preveni-la de infecções respiratórias pelo Vírus Sincicial Respiratório (VSR). Para tanto, alegou que: a) a Impetrante nasceu prematura de 28 (vinte e oito) semanas, não tendo alcançado a produção necessária da substância “surfactante”, motivo pelo qual teve que se submeter a um rigoroso tratamento hospitalar, tendo permanecido na UTI neonatal por 66 (sessenta e seis) dias; b) no período subsequente, apresentou quadro de bronquite viral grave, broncopneumonia e “sépse” (infecção geral grave causada por germes patogênicos), e, por essa razão, foi-lhe receitado o medicamento Palivizumab (synagis) na dose de 15 mg/kg, com aplicação mensal no período de sazonalidade (05 meses), conforme solicitações médicas juntadas aos autos, pois tal medicamento “tem como finalidade nutrir o organismo de um anticorpo humanizado específico para combater infecções respiratórias, especialmente àquelas desencadeadas pelo Vírus Sincicial Respiratório “VSR”” (fl. 05); c) cada dose do medicamento custa em média R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), ou seja, o tratamento totalizaria o valor de R$ 27.500,00 (vinte sete mil e quinhentos reais), quantia essa que não pode ser suportada pelo seu genitor, que é ajudante de fábrica e aufere salário mensal de R$ 860,00 (oitocentos e sessenta reais); d) o medicamento foi solicitado à Secretaria Municipal de Saúde, porém não obteve resposta até o momento.

2) O pedido liminar foi deferido (fls. 64/70), determinando-se que fosse fornecido à Impetrante o medicamento “Palivizumab (synagis) 15mg/kg, durante toda a duração do tratamento, ou seja, 01 (uma) dose mensal por cinco meses (05 doses), conforme solicitações médicas que instruem os autos.

3) O ESTADO DO PARANÁ requereu o seu ingresso na lide (fl. 80).

4) A Autoridade apontada como Coatora prestou informações (fls. 85/93), sustentando que: a) não é cabível o mandado de segurança no presente caso, pois apesar de constar dos autos receituário médico atestando a existência da doença e a indicação do tratamento solicitado, não se pode afirmar, com certeza, que tal opção é a mais correta, sendo necessário, para tanto, dilação probatória (perícia técnica para a verificação da real necessidade e utilidade da medicação receitada), o que é vedado pela via processual eleita; b) “a obrigação constitucional de proteção à saúde dar-se-á por meio de políticas econômicas e sociais que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário as ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação” (fls. 88/89); c) a negativa de fornecimento do remédio “deve-se ao estrito seguimento dos Protocolos criados pelo Ministério da Saúde, órgão tecnicamente capacitado e competente para a definição do tratamento mais adequado a dada enfermidade, mormente por se pautar em pesquisas mundialmente reconhecidas e tendências cientificamente comprovadas” (fl. 91); d) o uso livre e arbitrário de medicamentos baseados em uma única indicação de cada profissional da área médica, ainda que na maioria das vezes cientificamente correta, permite o surgimento de resistência bacteriana de determinadas patologias; e) o remédio solicitado, apesar de ser registrado na ANVISA e de ter, portanto, a sua comercialização autorizada, não faz parte dos medicamentos gerenciados pelo Centro de Medicamentos do Paraná – CEMEPAR; f) inexiste negativa ou omissão no fornecimento do remédio postulado, o que torna ausente o ato arbitrário ou ilegal a ser corrigido por mandado de segurança; g) é preciso que os procedimentos e a política de saúde do Ministério da Saúde autorizem o fornecimento do remédio, conforme posologia prescrita à Impetrante.

Requereu a dilação de prazo (30 dias) para o efetivo cumprimento da decisão que deferiu a liminar, a fim de que o Centro de Medicamentos do Paraná/SESA possa fazer a aquisição do remédio. Postulou a revogação da liminar e, ao final, a denegação da segurança.

5) A SECRETÁRIA DE SAÚDE DO ESTADO requereu o aditamento das informações já prestadas (fl. 96), informando que já está disponibilizando o medicamento solicitado pela Impetrante na Farmácia da 2ª Regional de Saúde de Curitiba, a qual entrará em contato com o genitor da paciente ou seu advogado para que

possam efetuar a retirada do remédio (fls. 97/100).

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

A Impetrante tem razão.

Conforme solicitações médicas juntadas aos autos (fls. 42/43 e fl. 44), a Impetrante nasceu prematura de 28 (vinte e oito) semanas de idade, tendo já apresentado quadro de “distress respiratório” (“Doença da Membrana Hialina”), feito uso de “surfactente, sepse, e evoluiu com broncodisplasia e necessidade de UTI neonatal durante 66 dias” (fl. 44), e, ainda, apresentado “quadro de bronquiolite importante, e broncopneumonia fevereiro de 2011” (fl. 42). Constam das referidas solicitações médicas a necessidade do medicamento no período da sazonalidade do Vírus Sincicial Respiratório (VSR), que vai de maio a setembro, a fim de prevenir a Impetrante de infecções respiratórias, tendo em vista o quadro de complicações pulmonares já apresentados pela paciente, e, ainda, a quantidade necessária (05 doses).

A informação constante na fl. 56 demonstra o alto custo do remédio, ao passo que o Recibo de Pagamento de Salário do genitor da Impetrante (fl. 50), ajudante de fábrica, demonstra a sua impossibilidade de arcar com os gastos do tratamento de sua filha.

O direito do paciente de ter acesso ao medicamento de que necessita está constitucionalmente garantido pelo artigo 196 da Constituição Federal, que dispõe: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Na qualidade de direito fundamental, ao direito à saúde deve ser conferido a mais ampla e irrestrita interpretação.

Não se pode olvidar que, conforme prevê o § 1º do artigo 5º do texto constitucional, os direitos fundamentais são de aplicação imediata e não mera lista de objetivos a serem atingidos, impondo ao Poder Público um dever, e não uma faculdade.

Nesse sentido: “A saúde é direito social do cidadão e dever do estado que deve assegurá-la com o fornecimento de medicamentos indispensáveis ao tratamento de doença” (TJPR. Agravo de Instrumento nº 164166-9. Rel. Juiz Designado ESPEDITOREIS DO AMARAL, DJ 24/03/2006).

A propósito, o voto esclarecedor da Min. ELIANA CALMON, proferido no julgamento do RMS 17425/MG, DJ 22.11.2004, p. 293: “Esta corte tem reconhecido que os portadores de moléstias graves, que não tenham disponibilidade financeira de custear o seu tratamento, têm direito de receber gratuitamente do Estado os medicamentos de comprovada necessidade. Precedentes. 2- O direito à percepção de tais medicamentos decorre de garantias previstas na Constituição Federal, que vela pelo direito à vida (art. 5º, caput) e à saúde (art. 6º), competindo à União, Estados, Distrito Federal e Municípios o seu cuidado (art. 23, II), bem como a organização da Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR. seguridade social, garantindo a ‘universalidade da cobertura e do atendimento’ (art. 194, parágrafo único, I). 3- A Carta Magna também dispõe que “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação’ (art. 196), sendo que o ‘atendimento integral’ é uma diretriz constitucional das ações e serviços públicos de saúde (art. 198)” (sem destaque no original).

Tal posicionamento se mantém, sendo diversos os julgados posteriores no mesmo sentido, a exemplo do proferido no RMS 17449/MG, DJ 13.02.2006, p. 719, onde foi Relator o Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS: “Comprovado, através de relatório médico acostado aos autos, que a impetrante já fora submetida a outro tratamento convencional, sem êxito, não há como se negar o acesso a outro medicamento recomendado pelo especialista que a acompanha”.

No mesmo sentido, decisão da Ministra ELLEN GRACIE, que indeferiu o pedido de suspensão de liminar para fornecimento de remédio, requerido pelo Estado do Amazonas, consignando que: “Assim, no presente caso, atendo-me à hipossuficiência econômica da impetrante e de sua família, á enfermidade em questão, à inoperância de outras medicações já ministradas e à urgência do tratamento que requer a utilização do medicamento importado, em face dos pressupostos contidos no art. 4º da Lei 4.348/64, entendo que a interrupção do tratamento poderá ocasionar graves e irreparáveis danos à saúde e ao desenvolvimento da impetrante, ocorrendo, pois, o denominado perigo de dano inverso, o que faz demonstrar, em princípio, a plausabilidade jurídica da pretensão liminar deduzida no mandado de segurança em apreço.

Ressalte-se que a discussão e relação à competência para a execução de programas de saúde e de distribuição de medicamentos não pode se sobrepor ao direito à saúde, assegurado pelo art. 196 da Constituição da República, que obriga todas as esferas de Governo a atuarem de forma solidária” (DJU de 8.6.2007 e no sítio informativo@stf.gov.br).

Ademais, ao contrário do alegado pela Impetrada, não são os Protocolos criados pelo Ministério da Saúde os mais capacitados e competentes para a definição do melhor tratamento a dada enfermidade, mas, sim, os médicos responsáveis pelo acompanhamento da paciente, que são os quem têm melhores condições de averiguar as reais necessidades da Impetrante.

Por outro lado, é oportuno destacar que a hipossuficiência do genitor da Impetrante não foi questionada, estando também demonstrada a omissão da Secretaria Estadual de Saúde em fornecer o medicamento postulado pela paciente, já que, inclusive, foi solicitado por sua genitora intervenção do Ministério Público para obter o remédio (fl. 46), tendo apenas havido manifestação da 2ª Regional de Saúde, que encaminhou o Ofício nº 16/2011 à Promotora de Justiça responsável pelo caso, no qual apenas recomenda que a infante “seja encaminhada a um serviço de Pneumologia Infantil do SUS através da Unidade Básica de Saúde de seu município para uma avaliação e prescrição de conduta” (fl. 48)

Dessa forma, resta caracterizada violação a direito líquido e certo, qual seja, o direito à saúde.

A propósito, ressalte-se que prova pré-constituída nos autos de que a utilização do medicamento “Palivizumab (synagis)” é necessária para prevenir a Impetrante de infecções respiratórias no período de sazonalidade (maio a setembro), em razão do seu histórico de complicações pulmonares (Relatório Médico de fls. 30/31 e Receituários Médicos de fls. 33/37).
Igualmente, não há como se acolher a alegação de que a via mandamental eleita é inadequada ao bem da vida que se postula, pelo fato da comprovação do direito alegado pressupor dilação probatória por meio de prova pericial. Isso porque, este Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que a solicitação médica é prova suficiente para comprovar a necessidade/utilidade do tratamento que se pleiteia, senão vejamos: "Ainda que haja uma política pública estruturada que culminou na organização do Sistema Único de Saúde-SUS, não há como negar a competência do médico que assiste à impetrante para fazer o diagnóstico de sua enfermidade e lhe receitar o remédio adequado, bem como, que o indeferimento do pleito de medicamento, feito ao órgão público, importa em ferir direito líquido e certo da impetrante, pois que a Lei Maior de nosso país impõe, a todos, o dever de assistência integral à saúde, inclusive ao Estado. Precedentes jurisprudenciais" (MS (Gr/C.Int-Cv) 0403700-5 - 4ª Câmara Cível em Composição Integral - Relatora: Des. ANNY MARY KUSS. DJ nº 7396, de 29/06/2007).

Dessa forma, o não fornecimento do remédio considerado essencial à melhora do estado de saúde da paciente necessita de proteção que se pode dar pela via do Mandado de Segurança.

Assim, considerando que restou demonstrada a necessidade de determinado medicamento específico e a impossibilidade do genitor da Impetrante adquiri-lo com recursos próprios, deve ser concedida a ordem para o fornecimento gratuito do medicamento Palivizumab (synagis) 15mg/kg, levando-se em consideração que o direito à saúde é fundamental, merecendo a máxima efetividade.

ANTE O EXPOSTO, voto por que seja concedida a segurança, conforme determinado pela decisão liminar (a fim de que seja fornecido à Impetrante o medicamento Palivizumab (synagis) 15mg/kg, “durante toda a duração do tratamento, ou seja, 01 (uma) dose mensal por cinco meses (05 doses)”). Condeno o Estado doParaná no pagamento das custas processuais.

DECISÃO

ACORDAM os integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, em composição integral, por unanimidade de votos, em conceder a segurança.


CURITIBA, 07 de junho de 2011.

Desembargador LEONEL CUNHA

Relator


O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.tjpr.jus.br